Saturday, November 17, 2007

Eis O Eterno Retorno

Nietzsche, Aurora.
Aforismo 376: "Dormindo Muito - O que fazer para se estimular quando se está cansado e saturado de si mesmo? Uma pessoa recomenda o cassino, a outra o cristianismo, a terceira a eletricidade. O melhor, porém, meu caro melancólico, é dormir muito, em sentido próprio e impróprio! Assim teremos novamente a nossa manhã! A peça de arte, na sabedoria de viver, é saber intercalar o sono de toda espécie no momento certo."

Sunday, November 11, 2007

Let's Face It

Vanity may mask vulnerability.

Saturday, October 27, 2007

"Vermelhura da Manhã" (Exercício de Tradução)

Como eu já disse em outra ocasião, infelizmente eu ainda não sei ler em alemão. No entanto, isso não me impede de tirar uma conclusão que parece ser razoável da comparação de duas traduções diferentes para a mesma obra cujo original está na língua de Göethe. Falo de duas traduções de MORGENRÖTE, De Nietzsche. Tudo bem que o título em português, Aurora, é mais bonito do que em inglês, Daybreak. Mas acompanhem comigo as duas traduções que cito abaixo do mesmo aforismo, o de número 539:
Primeiro em português, na tradução de Paulo César de Souza para a Cia das Letras (2004):
"Vocês sabem o que querem? - Nunca os torturou o medo de ser completamente inaptos para reconhecer o que é verdadeiro? O medo de seu tino ser muito obtuso, de mesmo a sensibilidade da visão ainda ser muito grosseira? Se (sic) notarem que tipo de vontade governa por trás de sua visão? Por exemplo, como ontem queriam ver mais que um outro, hoje querem ver diferente do outro, ou como já no princípio anseiam achar uma confirmação, ou o oposto daquilo que até o momento acreditou-se achar! Oh, vergonhosos desejos! Como vocês freqüentemente buscam o que o (sic) produz efeito forte e o que tranqüiliza - porque estão cansados! Sempre com ocultas predeterminações de como deveria ser a verdade, para que vocês pudessem aceitá-la! Ou acreditam que hoje, quando estão gelados e secos como uma clara manhã de inverno e nada lhes ocupa o coração, teriam uma visão melhor? Não se requer calor e entusiasmo para fazer justiça a uma coisa do pensamento? - e justamente isso é ver! Como se vocês pudessem tratar as coisas do pensamento de forma diferente da como lidam com pessoas! Nesse trato há a mesma moralidade, a mesma probidade, as mesmas segundas intenções, a mesma frouxidão, o mesmo temor - o seu amável e odioso Eu! Seus cansaços físicos darão cores cansadas às coisas, suas febres os tornarão monstros! Sua manhã não ilumina as coisas de forma diferente de sua tarde? Não temem reencontrar, na caverna de todo conhecimento, o seu próprio fantasma, como uma trama de que a verdade se mascarou perante vocês? Não é uma horrível comédia, esta na qual querem irrefletidamente representar um papel? -"
A mim me soa tão obtusa essa tradução, tão desconjuntada, a ponto de eu não saber, na frase seguinte, o que eu li na frase anterior. Vejam agora a tradução para o inglês de R. J. Hollingdale para a edição da Cambridge University Press (1997):
"Do you know what you want? - Have you never been plagued by the fear that you might be completely incapable of knowing the truth? The fear that your mind may be too dull and even your subtle faculty of seeing still much too coarse? Have you not noticed what kind of will rules behind your seeing? For example, how yesterday you wanted to see more than another, today differently from another, or how from the very first you longed to find what others fancied they had found or the opposite of that! Oh shameful craving! How you sometimes looked for something which affected you strongly, sometimes for what soothed you - because you happened to be tired! Always full of secret predeterminations of how truth would have to be constituted if you would consent to accept it! Or do you believe that today, since you are frozen and dry like a bright morning in winter and have nothing weighing on your heart, your eyes have somehow improved? Are warmth and enthusiasm not needed if a thing of thought is to have justice done to it? - and that precisely is seeing! As thought you were able to traffic with things of thought any differently from the way you do with men! In this traffic too there is the same morality, the same honourableness, the same reservations, the same slackness, the same timidity - your whole lovable and hateful ego! When you are physically tired you will bestow on things a pale and tired coloration, when you are feverish you will turn them into monsters! Does your morning not shine upon things differently from your evening? Do you not fear to re-encounter in the cave of every kind of knowledge your own ghost - the ghost which is the veil behind which truth has hidden itself from you? It is not a horrible comedy in which you so thoughtlessly want to play a role? -"
Sem querer conhecer melhor o texto original de Nietzsche e o(s) sentido(s) preciso(s) dos termos que ele usa em alemão, dá, por outro lado, para tentar fazer uma tradução improvisada para o português sem incorrer em alguns erros estilísticos. Vejam o resultado:

Tu sabes o que queres? – Acaso tu nunca foste acometido pelo medo de poder ser completamente incapaz de saber a verdade? Pelo medo de que tua mente seja por demais lesada e ainda que tua sutil capacidade de visão seja ainda muitíssimo tosca? Acaso não percebeste que tipo de vontade governa por detrás de tua visão? Por exemplo, como ontem tu quis ver mais que outrem, hoje diferentemente de outrem, ou como desde o princípio tu procuraste encontrar aquilo que os outros fantasiavam terem encontrado ou mesmo o oposto disso! Ó vergonhosa concupiscência! Como tu às vezes procuraste por algo que te afetasse fortemente, às vezes por aquilo que te tranqüilizasse – porque tu estavas cansado! Sempre cheio de predeterminações secretas de como a verdade deveria ser constituída se tu consentisse em aceitá-la! Ou acaso acreditas que hoje, já que estás congelado e seco como uma manhã luminosa no inverno e não tem nada pesando no seu coração, teus olhos de alguma forma melhoraram? Acaso o calor e o entusiasmo não são necessários para se fazer justiça a uma coisa do pensamento? – e isso é, precisamente, ver! Como se tu fosses capaz de lidar com coisas do pensamento de alguma forma diversa da forma com que tu lidas com os homens! Também nesta relação existe a mesma moralidade, a mesma honorabilidade, as mesmas reservas, a mesma frouxidão, a mesma timidez – teu inteiro, amável e odioso Eu! Quando tu estás fisicamente cansado tu irás transferir às coisas uma coloração pálida e opaca; quando tu estiveres febril tu irás transformá-las em monstros! Acaso a tua manhã não brilha sobre as coisas de forma diversa da forma como brilha a tua tarde? Acaso não temes re-encontrar na caverna de todo tipo de conhecimento o teu próprio fantasma – o fantasma que é o véu atrás do qual a verdade se escondeu de ti? Acaso não é em uma terrível comédia onde tu queres tão irrefletidamente desempenhar um papel? –

Thursday, August 23, 2007

He again, again and again...



Por falar em movimento político, tinha esquecido que a ode Prometeu, do Goethe, reproduzida logo ai em baixo, era peça de cabeçeira do Marx. Imaginem a reação que não deveria produzir o pensamento do cara ai do lado...

Gustave Moreau, Prometeu

Monday, August 20, 2007

E não era sem tempo...

Na coluna social de hoje da Folha, achei esta pérola. Já aderi, mais alguém se candidata?
Folha - Por que não aderiu ao "Cansei"?
Luciano Camargo - Como é que eu vou apoiar um movimento liderado por alguém que promove desfile de cachorros [o empresário João Doria]? Essas pessoas cansaram de quê? Os artistas só estão aderindo porque foram convidados por amigos. A maioria não tem coragem de dizer não. Eu tenho. Este é mais um movimento oportunista. As pessoas que estão nesse movimento não cansaram de coisa nenhuma.
Folha - O Zezé aderiu.
Luciano - O Zezé é o Zezé, eu sou eu.
Folha - Você já disse que se arrepende de ter apoiado o candidato Lula na eleição.
Luciano - Eu não me arrependo. Eu me decepcionei. Mas nem acho que o "Cansei" é para derrubar o Lula. Aquilo ali [Lula] nem com reza brava cai. Mas o "Cansei" tem uma classe elitista por trás, que nunca pegou fila para entrar num avião. É um movimento político. Estavam só esperando um momento oportuno para lançar. Protesto é ir para a frente do prédio da TAM. Eu cansei desse "Cansei". Vou lançar o "Caguei". Caguei para o "Cansei".

Wednesday, August 01, 2007

Acho que essa versão é mais real...


Enquanto isso, em Springfield...

Esse sou eu no universo de Springfield! Devo ser um amigo do Homer, ou Tio do Bart, da Lisa e da Maggy...

Friday, July 27, 2007

Prometheus

Como os últimos posts tem um quê de gélido, para esquentar um pouco vou postar hoje uma Ode do Göethe chamada Prometheus, que eu conheci através de uma referência nos Quaderni do Gramsci. Depois eu posto o comentário magnífico do italiano sobre o poema, que é também uma síntese sobre o fazer artístico, vulgo poetar. Eis a Ode:

PROMETHEUS (1773) - Johann Wolfgang von Goethe

COVER thy spacious heavens, Zeus,
With clouds of mist,
And, like the boy who lops
The thistles' heads,
Disport with oaks and mountain-peaks,
Yet thou must leave
My earth still standing;
My cottage too, which was not raised by thee;
Leave me my hearth,
Whose kindly glow
By thee is envied.

I know nought poorer
Under the sun, than ye gods!
Ye nourish painfully,
With sacrifices
And votive prayers,
Your majesty:
Ye would e'en starve,
If children and beggars
Were not trusting fools.

While yet a child
And ignorant of life,
I turned my wandering gaze
Up tow'rd the sun, as if with him
There were an ear to hear my wailings,
A heart, like mine,
To feel compassion for distress.

Who help'd me
Against the Titans' insolence?
Who rescued me from certain death,
From slavery?
Didst thou not do all this thyself,
My sacred glowing heart?
And glowedst, young and good,
Deceived with grateful thanks
To yonder slumbering one?

I honour thee! and why?
Hast thou e'er lighten'd the sorrows
Of the heavy laden?
Hast thou e'er dried up the tears
Of the anguish-stricken?
Was I not fashion'd to be a man
By omnipotent Time,
And by eternal Fate,
Masters of me and thee?

Didst thou e'er fancy
That life I should learn to hate,
And fly to deserts,
Because not all
My blossoming dreams grew ripe?
Here sit I, forming mortals

After my image;
A race resembling me,
To suffer, to weep,
To enjoy, to be glad,
And thee to scorn,
As I!


E o original em alemão, para quem pode (eu não...):


Bedecke deinen Himmel, Zeus,
Mit Wolkendunst!
Und übe, Knaben gleich,
Der Disteln köpft,
An Eichen dich und Bergeshöhn!
Mußt mir meine Erde
Doch lassen stehn,
Und meine Hütte,
Die du nicht gebaut,
Und meinen Herd,
Um dessen Glut
Du mich beneidest.

Ich kenne nichts Ärmeres
Unter der Sonn als euch Götter.
Ihr nähret kümmerlich
Von Opfersteuern
Und Gebetshauch
Eure Majestät
Und darbtet, wären
Nicht Kinder und Bettler
Hoffnungsvolle Toren.

Da ich ein Kind war,
Nicht wußte, wo aus, wo ein,
Kehrte mein verirrtes Aug
Zur Sonne, als wenn drüber wär
Ein Ohr zu hören meine Klage,
Ein Herz wie meins,
Sich des Bedrängten zu erbarmen.

Wer half mir wider
Der Titanen Übermut?
Wer rettete vom Tode mich,
Von Sklaverei?
Hast du's nicht alles selbst vollendet,
Heilig glühend Herz?
Und glühtest, jung und gut,
Betrogen, Rettungsdank
Dem Schlafenden dadroben?

Ich dich ehren? Wofür?
Hast du die Schmerzen gelindert
Je des Beladenen?
Hast du die Tränen gestillet
Je des Geängsteten?

Hat nicht mich zum Manne geschmiedet
Die allmächtige Zeit
Und das ewige Schicksal,
Meine Herren und deine?

Wähntest du etwa,
Ich sollte das Leben hassen,
In Wüsten fliehn,
Weil nicht alle Knabenmorgen-
Blütenträume reiften?

Hier sitz ich, forme Menschen
Nach meinem Bilde,
Ein Geschlecht, das mir gleich sei,
Zu leiden, weinen,
Genießen und zu freuen sich,
Und dein nicht zu achten,
Wie ich.

Wednesday, June 13, 2007

Of Bodies: Nudes, Shells and Vegetables








(1934) Edward Weston, Nude;
(1927) Edward Weston, Two Shells;
(1930) Edward Weston, Pepper.

Subindo um pouco o nível formal do blog, queria mostrar estas três fotografias do artísta americano Edward Weston (1886-1958). As três imagens são, cronologicamente e conceitualmente, do miolo da carreira de Weston, isto é, correspondem, de um lado, aos anos 20-30 do século XX e, de outro, ao esforço do fotógrafo por depurar ao máximo a sua busca formal, de modo que as três imagens acima são produto de uma única e mesma visão sobre a realidade e suas aparências. Como diz o próprio artista:
“The camera should be used for a recording of life, for rendering the very substance and quintessence of the thing itself, whether it be polished steel or palpitating flesh.”
Dessa forma, a fotografia age como a execução de uma complexa, porém coerente, partitura musical, onde cada uma das diversas notas que a câmera toca correspondem à uma múltipla variedade de atributos, como alturas, timbres, durações e intensidades que definem, em seu conjunto, a posição específica e única de cada um dos múltiplos pontos que compõem os corpos em exibição no espaço. À posição específica de cada um dos pontos em relação aos demais corresponderia, em contraposição, a essência comum dos corpos entre si que, pensados como um todo, formam uma única realidade. A substância é una, mas suas manifestações são sempre múltiplas; carne ou aço, nus, conchas ou vegetais são apenas aparências diversas para uma única e mesma inescapável evidência: a forma.

Monday, May 28, 2007

Tentaculando


Voltando aos fabulosos usos tentaculares, faz um tempinho já que estou em dúvida se deveria postar ou não essa imagem acima, que diz muito por si mesma e que, portanto, não precisa muito de comentários. Só queria dizer que independentemente de ser considerada pornográfica ou não, o exotismo da foto me chamou tanto a atenção que prefiro considerá-la como um caso bastante idiossincrático de erotismo, mesmo porque ainda que a imagem não tenha sido pensada (penso eu) como obra, a simples exposição dessa prática milenar, somada aos tons limpidamente róseos do tapete, do próprio polvo e do corpinho delicado e teso da modelo me fazem lembrar um pouco da estética de filmes como Dolls, do Takeshi Kitano. Algo entre uma super-exposição de uma prática milenar e, portanto, possivelmente comum, e um ultra-intimismo de uma atitude bastante original que, com certeza, devem provocar reações sensórias interessantes no expectador. Só isso já justificaria a presença dessa imagem aqui. Comentários, como sempre, são muito bem-vindos...
* Para aqueles que não entenderam onde isso se encaixa aqui no blog, favor ver os posts abaixo aqui.

Saturday, May 19, 2007

Maior Complexidade

(2005) Alex Brown, Lexi, Óleo sobre tela, 63 x 82cm

O quadro acima aplica o mesmo princípio que o quadro abaixo, só que ao contrário. Aqui, a imagem é recodificada através de um aumento da complexidade. As linhas originais parecem ser mais simples, apenas trazendo a indicação dos contornos gerais, sem muito aprofundamento nos detalhes da figura, o que acaba sendo produzido justamente pelo processamento da imagem.

A Ótica Do Olhar Enviesado

(2005) Alex Brown, Alice, Óleo sobre tela, 78 x 64 cm.

Vagando pela internet, à procura de galerias internacionais de artistas contemporâneos, encontrei, já não me lembro bem onde, algumas obras desse ou dessa artista que acredito ser dos EUA, provavelmente numa galeria em NY. A imagem em questão tem um pequeno truque embutido. Para mim é claramente o exemplo do que eu talvez chamaria de arte da dinâmica imanente, capaz, de um lado, de figurar a potência e o ato ao mesmo tempo, além de estabelecer com o espectador, de outro lado, uma relação de imanência pelo qual se instaura a possibilidade de qualquer visibilidade ou, melhor dizendo, figuração. Contudo, nesse caso, a figuração se dá justamente pelo aumento da opacidade do visível, ou seja, para que se possa ver a figura contida por trás da imagem visível é necessário que se olhe de viés para o quadro, de forma que a distorção produzida por esse olhar reverta a codificação que transformou a figura nítida e clara inicial em múltiplos pequenos segmentos homogêneos de cor, como acontece de forma homóloga com a conversão de arquivos de som para formatos de tamanho mais reduzido. Assim, o artista reduz a complexidade inicial da imagem para um nível no qual são preservadas apenas as relações essenciais entre os elementos, sem as quais o quadro perderia a identidade estrutural que estabelece como a imagem inicial. O olho humano, ao criar uma segunda distorção, como quando produzimos propositalmente um embaçamento da visão, restaura de uma forma magnífica se não a imagem inicial em sua integridade, pelo menos os detalhes que não são percebidos pelo olhar despreocupado. O que fascina, nisso, é que se pode postular a partir daí uma certa homologia também entre a distorção do olhar enviesado e a distorção que foi produzida pelo artísta, muito provavelmente através do recurso à manipulação da imagem através de algum software.

Sharing Beauty


(2006) Joshua Strang, Aurora Over Alaska.
Astronomy Picture of the Day, http://antwrp.gsfc.nasa.gov/apod/astropix.html (April 9, 2007)
"Explanation: Higher than the highest mountain, higher than the highest airplane, lies the realm of the aurora. Aurora rarely reach below 60 kilometers, and can range up to 1000 kilometers. Aurora light results from solar shockwave causing energetic electrons and protons to striking molecules in the Earth's atmosphere. Frequently, when viewed from space, a complete aurora will appear as a circle around one of the Earth's magnetic poles. The above digitally enhanced photograph was taken in 2005 January shows a spectacular aurora borealis above the frozen landscape of Bear Lake, Alaska, USA. The above image was voted Wikipedia Commons Picture of the Year for 2006." (From the site referred above...)

Saturday, April 07, 2007

Shunga (Gravuras Eróticas)


(1814 circa) Katsushika Hokusai, "Pescadora Awabi e Octopus" ou "O Sonho da Mulher do Pescador", Gravura.
Não tenho como não notar a impressionante expressão compenetrada do octopus que se vê em seus olhos e nas cavidades que a provável falta de ar produzem em sua cabeça. Isso é pornografia? Acho que depende do referente. Será justo considerar pornográfico algo que pode produzir no espírito um sem-número de fantasias, onde no mais das vezes criamos todo o cenário visual, a situação é toda ela narrada dentro de nós por uma voz concupiscente , dando até nomes aos personagens da cena, tudo para aumentar ainda mais o prazer almejado. Isso parece ser muito diferente da mera sensação frictiva do contato físico tout court, sem nenhum sinal de qualquer ideação. No que será que o octopus está pensando?
Se alguém souber as referências certas dessa obra, por favor me envie como comentário aqui no Blog.

Pornografia e Erotismo


(1866) Gustave Courbet, L'Origine du Monde, Óleo s/ Tela, 46x55 cm, Musée D'Orsay, Paris.

Recomendo, para os que não conhecem, a obra acima "A Origem do Mundo", de Gustave Courbet, pintor dito realista (?) do século XIX. Nela, como todos podem ver, o artista retrata de forma bastante direta o orgão sexual feminino, sem subterfúgios ou mediações visuais, um pouco, se quiserem, como começara a fazer a fotografia. Agora uma pergunta: O que realmente incomoda numa imagem como essa? A frontalidade e evidência do sexo exposto? Se a obra fosse pintada hoje, não haveria quem não se perguntasse se isso é uma imagem erótica ou se não é, em realidade, pura pornografia. Muitos, aposto que a maioria, diriam que é simplesmente uma imagem pornô. Depois que o observador descobrisse que se diz do pintor pertencer ao "filo" realista, não haveriam mais dúvidas... Mas é justamente aí onde reside, aos meus olhos, o verdadeiro incômodo da obra. O que significa dizer que Courbet era um pintor "realista"? O que uma classificação taxonômica como essa, fundada numa falsa idéia de um naturalismo intrínseco à toda forma artística, revela da obra? Que a imagem é clara e direta, como disse acima? Ora, não foi preciso esperar Freud criar a Psicanálise com sua Interpretação dos Sonhos para que pudéssemos dizer, com total "conhecimento de causa", que existe uma diferença entre um conteúdo manifesto e outro latente nos produtos do espírito humano. Freud não criou essa distinção do nada, como se antes dele todas as obras, particularmente as de cunho artístico, não significassem mais do que a sua pura existência material. Pelo contrário. Foi só depois dele que a idéia da pura materialidade como sinônimo das obras de arte passou a existir, justamente por Freud ter explicitado uma diferença que antes era tácita, porém subjacente à produção artística de todos os tempos.
Voltando à minha pergunta central: o que produz incômodo na pintura de Courbet? Não há como sustentar uma filiação como a que subscreve Courbet dentro de um gênero realista se confrontamos aquilo que mostra a pura visualidade do quadro em questão com o próprio título que a ele confere o artista, título que é, como todo o quadro, uma porta de abertura para se pensar minimamente, sem qualquer outra informação adicional, sobre a idéia que o pintor tinha em mente quando retratou de forma "tão realista" a origem do mundo... Nesse caso, vale a pena se questionar também em que medida a obra em questão chega, na cabeça do pintor, a ser considerada uma obra permeada de um certo "erotismo". Que erotismo é esse? É um erotismo sensual, que recorre mais aos efeitos produzidos nos nossos sentidos do que à nossa capacidade de chegar a um significado para a obra que é construído mediante o uso necessário das regras da razão? Não deveria ser a obra inserida dentro de um debate que contrapõe, de um lado, uma teogonia, e de outro, uma antropogonia carregada de uma certa dessacralização do mundo? E se pensamos que a obra possui esse tom laico fundamental, isso não a aproximaria de uma certa idéia um tanto corrente de que a pornografia é, antes de mais nada, a "ausência de um sentido mais profundo"? Seria então a pintura de Courbet, no final das contas e paradoxalmente, uma obra pornográfica? Acho que seria pedir um pouco demais de uma obra pornográfica que produza todo esse caminho de idéias, sem falsa modéstia.
Um caso similar ao da obra de Courbet são algumas pinturas de Hokusai mais ou menos do mesmo período que retratam uma famosa lenda oriental na qual uma garota, cuja ocupação era coletar pérolas de dentro das conchas no mar, é "seduzida" por um polvo e seus tentáculos, que se grudam na moça enquanto o octopus a suga com volúpia ardente. Esse tipo de obra, chamado no período de "shunga", era na verdade bastante comum desde o século XVII, fazendo parte de um grupo junto com outros artefatos (como os netsuke, pequenas esculturas que serviam como uma espécie de fivela) que representavam uma prática aparentemente real das moças de olhos puxados. Van Gogh adorava as obras que conhecia de Hokusai, tendo inclusive feito em algumas de suas pinturas citações diretas das mesmas. Em Hokusai como em Courbet tanto o erótico quanto o pornográfico envolvem a questão da sensualidade/sexualidade; contudo, a diferença está no tratamento dado por cada "técnica". Enquanto o pornográfico só se interessa por apresentar diretamente, sem subterfúgios ou jogos de linguagem, esse objeto, já o erótico utiliza o mesmo objeto só que introduz nele sentidos outros, que não são necessariamente veiculados por uma ocultação do orgão. O que é direto ou indireto é o sentido ou sentidos atribuído(s) ao objeto, e não o objeto em si. A frontalidade do quadro de Courbet nada mais é do que uma provocação, não apenas aos sentidos, mas à razão, à nossa pressa em tirar conclusões precipitadas sobre imagens que falam mais quanto mais são deixadas entrever-se no silêncio de suas sugestões.
Pornografia por si mesma não é arte, segundo o meu entender, pois não eleva o objeto retratado de sua mera condição de objeto. Quando Duchamp põe um mictório numa exposição, ou uma roda de bicicleta, ele está transformando a condição de mero objeto do mictório em algo diverso, capaz de gerar associações e sentidos diversos daqueles que o mesmo objeto teria se estivesse simplesmente num banheiro público. Como bem sabe Courbet, sua Origem do Mundo faz pensar. Ainda mais quando Eros não se deixa entrever claramente pela Alma...
Para o Jorge...

Friday, March 30, 2007

Haikai

Brisa Branca

Na neve escorrega a leve lágrima da branda lebre.
Frescor da bruma da manhã,
Chá ligeiro!
Para a Júlia e a Natália...

Heart Of Gold


The Yellowstone National Park, Wyoming, USA.
If you look right at the picture above, you'll find that the sulfurous water is shaped like a heart, a heart of gold. I wish that just the contemplation of its marvelous pattern of colours could lead your heart to blossom in a full path of gold, and that you could show this to other persons and say how much your eyes got clear today through this gift of nature's powers...
To Paula and all you people out there...

Monday, March 26, 2007

The Greatness Of Good


(1505 c.) Rafael, "São Miguel e o Dragão", Óleo sobre Madeira, 31x27 cm, Louvre.

For those who suffer, the bold and calm, equilibrated and balanced, but nonetheless powerful and brave, gesture of the angel can serve as an uplifting consolation, for only a being thus conceived in greatness can truly express a gentleness in the heart that can lead to a genuine peace of mind and a complete release from evil...

For a great friend...